domingo, 20 de julho de 2008

Leonard Cohen, Lisboa 19.07.08
















Foto: Magdalena Stokowska

"Dance me to your beauty with a burning violin. Dance me through the panic till I’m gathered safely in. Lift me like an olive branch and be my homeward dove. Dance me to the end of love.”


Eram exactamente 21.00 h (a hora marcada para o início do espectáculo) quando uma das maiores lendas vivas da cultura pop contemporânea subiu no passado sábado dia 19 ao palco montado à beira Tejo junto a Algês.

Leonard Cohen apresentou-se em Lisboa, vinte anos depois do concerto do Coliseu dos Recreios (vinte e três passados do lendário concerto de estreia em Cascais), pronto a dilacerar o coração e a alma das mais de 9.000 pessoas que ali rumaram para o ver e ouvir.




Foto: Magdalena Stokowska

Vestido elegantemente com um fato clássico cinzento às riscas Armani e com um “fedora” na cabeça tal como um “Old Bogart”, Cohen soltou um enorme sorriso em forma de agradecimento pela estrondosa (primeira) ovação que acabava de receber e iniciou sem mácula e aviso o já clássico “Dance me to the end of love”, Algês veio abaixo, caiu literalmente tudo. Com toda a sua classe e com a lábia que só um “sacana muito batido” sabe ajoelhou-se e começou a soltar vagarosamente os primeiros versos de uma canção que só encontra talvez rival em “Ne me quitte pas” de Jacques Brel, aquelas palavras ditas em jeito de declamação com aquela (ainda) voz de trovão mas agora também mais aveludada revelaram-se letais, começando logo a causar estragos, olhando à volta era impressionante observar como a maioria das pessoas não conseguia conter as lágrimas que teimavam em correr-lhes pelos rostos abaixo, “Dance me to the end of love” tornou-se aos poucos insuportável de se escutar, mas ao mesmo tempo causava um prazer masoquista tremendo que não era possível de todo explicar, raparigas de vinte e poucos anos escutavam-na com a mão direita no coração, a devoção era completa e comovente, o total silêncio reinava em Algês, terminada esta Cohen saltou logo para “The Future”, canção título do último disco que promoveu em digressão no já distante ano de 1993 (Cohen afastou-se dos palcos nos últimos catorze anos dedicando-se apenas à meditação, poesia e escrita), aligeirando-a agora com uma subtil troca do verso original “give me crack or anal sex” pelo mais politicamente correcto “give me crack or careless sex”, a partir de então foi o desfilar de verdadeiras pérolas intemporais, “Bird on the wire” teve direito a nova ovação, “Who by fire” começou com um belíssimo solo de archilaud por Javier Mas e “Hey, that’s no way to say goodbye” foi a confirmação de que tal como os diamantes certas canções são eternas. Mais canções se seguiram com particular destaque para os álbuns da década de 80 “I’m your man” 90 “The Future” como “Ain’t no cure for love”, “Everybody knows” ou “Anthem” devidamente intercaladas pelos já mencionados clássicos da década de 60, canções estas mais que perfeitas e que só alguém como Leonard Cohen as podia ter escrito. Com o final da primeira parte e depois de um intervalo de 20 m o segundo "set" iniciou-se com Cohen nas teclas e “Tower of Song” a tal da “golden voice” seguida logo depois de mais uma tremenda ovação quando se escutou os primeiros acordes de “Suzanne”, aqui Cohen emocionou-se (sim, porque o homem também se emocionou) e emocionou também as perto de 10000 almas que estavam a assistir a um momento que ficará certamente proscrito na memória de todos. “Gypsy’s wife” foi o tema seguinte, Cohen visitava assim o álbum “Recent Songs” de 1979, aqui com novo destaque para o músico catalão Javier Mas e para a sua guitarra bandurria, entretanto ia aproveitando de igual modo para apresentar os músicos sempre que estes faziam um solo com o seu instrumento dividindo assim o protagonismo da noite (alguns deste músicos já o acompanham em digressão desde finais da década de 70) demonstrando uma humildade enorme, ora afastando-se da boca de palco sempre que os elementos femininos do coro cantavam, ora cantando ele baixinho “as deixas” que Sarah Robinson e as Webb Sisters iam interpretando alto. O concerto estava a ser sublime, cada canção era um autêntico clássico, "I'm your man", "Take This Waltz", etc...todas estas canções enormes eram cantadas de uma forma absolutamente irrepreensível, Cohen parecia não dar tréguas nem acusar os 73 anos de idade, completamente rejuvenescido (o álcool já deixou de ser problema à muito e as drogas ficaram esquecidas na década de 60), ia sorrindo como uma criança e agradecia repetidamente com o seu já tão característico “thank you friends”, as duas horas de concerto estavam a passar num instante, nos encores ainda houve tempo para, “So Long Marianne”, “First We Take Manhattan”, e aqui Algês voltou a tremer quando Cohen dizia com a sua voz de trovão “Than...We Take Berlim”, uma “Sisters of Mercy” de novo com Cohen na guitarra, depois revisitando novamente o álbum de 1984 “Various Positions” de onde já tinha sido igualmente interpretado “Hallelujah” (com outra estrondosa ovação), Cohen convidou as meninas Webb Sisters para interpretarem “If It Be Your Will” que elas fizeram de uma forma angelical acompanhadas por guitarra clássica e arpa. No último encore houve ainda alguém no público a pedir “Famous Blue Raincoat” (e com esta seria a perfeição), mas Cohen limitou-se a sorrir mais uma vez e iniciou “I Tried To Leave You”, era o sinal que a despedida estava próxima, na última canção chamou então ao palco toda a sua equipa de apoio, roadies, assistentes etc...(seriam perto de trinta pessoas em palco) e despediu-se com um sentido “Wither You Goest”, as últimas palavras “thank you so much friends” foram ditas, Cohen e restantes músicos agradeceram os aplausos e retiraram-se do palco para não mais voltar.










Foto: Magdalena Stokowska

No fim, olhando a cara das pessoas (muitas novamente em lágrimas) sentia-se que se tinha assistido a algo muito especial e grande, a alegria aos poucos dava lugar a alguma tristeza e nostalgia...Leonard Cohen tinha partido para não mais voltar...e Lisboa não vai esquecer este concerto por muitos e muitos anos....

Alinhamento:

Set 1

Dance Me to The End Of Love
The Future
Ain’t No Cure For Love
Bird On The Wire
Everybody Knows
In My Secret Life
Who By Fire
Hey That’s No Way To Say Goodbye
Anthem

Set 2

Tower Of Song
Suzanne
Gypsy’s Wife
Boogie Street
Hallelujah
Democracy
I’m Your Man
Take This Waltz

Encores:

So Long, Marianne
First We Take
Manhattan
Sisters Of Mercy
If It Be Your Will (The Webb Sisters)
Closing Time

I Tried To Leave you
Wither You Goest





















Foto: Magdalena Stokowska

Fotografias gentilmente cedidas por Magdalena Stokowska. (Thanks!)

3 comentários:

Teresa disse...

Querido Blue Bird,
Bem sabe do meu amor por ele. Bem sabe que amei o seu relato do concerto, a que dei protagonismo na Gota, em forma de post, e que agora encontrei aqui ampliado.

O seu relato é tão vívido que é como se eu tivesse estado lá. Cohen anda sempre comigo. Ainda há poucas semanas ouvi Bird on a Wire no alto de Mount Evans (ver fotografia que lhe enviarei por mail).

O concerto de Cascais é inultrapassável, apesar da mágoa de ele não ter cantado (como sempre) Famous Blue Raincoat (e um desgraçado à minha frente bem a pediu o tempo todo, acho que saiu de lá rouco). Cohen apresentou-me nessa noite a um clássico absoluto do country, contando singelamente que era uma música muito querida aos seus pais: Tennessee Waltz. Persegui a música nos vinte anos seguintes, Cohen só viria a oferecer-no-la em 2004, em Dear Heather, quando eu já tinha o original de Hank Williams e uma cover de Emmylou Harris.

Não me arrependo da minha decisão de não ir, sabe? É que faltar-me-iam demasiadas músicas. Todas as de Songs from a Room, para começar, à excepção de Bird on the Wire. TODAS, sem excepção, as de Songs of Love and Hate.

Blue Bird, repito que ele anda sempre comigo, ele que é o meu Álvaro de Campos cantado. E tenho a memória luminosa e inesquecível do concerto de 1985... :)

Eu quero sempre o impossível, eu quero a perfeição absoluta, e poucas coisas andaram mais perto disso do que o concerto de Cascais. São mesmo muitas músicas a faltar... Demasiadas. À grande lsita já mencionada crescento duas: Take this Longing, Who By Fire

Teresa disse...

P.S. Pode ouvir Tennessee Waltz aqui: http://www.imeem.com/agripina/music/x9OzUa3T/leonard_cohen_tennessee_waltz/

Paula Crespo disse...

Foi sem dúvida um momento mágico que durou cerca de 3 horas. E que perdurou...
Gostei imenso do concerto e, tendo-o visto em 1985, foi bom poder rever este grande Senhor.Um Mestre.